quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Dogmas Corporativos

A planilha de nomes de clientes criada pelo Laerte Praxedes, ex supervisor da área de cadastro de clientes e ex-chefe de nosso amigo Teixeira, ou Senhor Teixeira, para os subordinados, é tida como uma verdadeira bíblia sagrada dentro da corporação.

Elaborada em 1987 pelo minucioso Praxedes, a planilha relaciona diversos clientes com suas subsidiárias, outros nomes fantasia, empresas controladas etc. Seu principal uso é para distribuir organizar o setor de vendas, permitindo assim que um único vendedor atenda o mesmo grupo de empresas.

Questionar a planilha de vendas é a mesma coisa de se questionar o que está escrito nas sagradas escrituras. Se lá está escrito que a Vasp é o principal cliente da empresa, é uma injúria tentar dizer que isso está fora da realidade. E aquele que levantar essa inverdade será considerado um pagão.

Outro dia mesmo, Leandro Leal, estagiário do departamento de finanças, foi questionar o porquê de o Banespa ainda constar como cliente da Prodesp – Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo, se há anos o banco foi privatizado. Aquilo foi tomado como uma ofensa ao divino. Como um simples estagiário ousou questionar um dogma que nem mesmo os diretories mais respeitados pensam em discutir? Teixeira ficou furioso. A planilha do Praxedes é inquestionável, disse ele.

Teixeira, aliás, usa a planilha do Praxedes para tudo. Por ser um profundo conhecedor de seu conteúdo, afinal era o customer register suporter junior favorito do Dr. Sebastião, criador da planilha., em qualquer querela envolvendo segmentação de clientes logo evoca a planilha de Praxedes, contra a qual nenhum argumento tem valor. Assume assim um papel de sábio, referência quando o assunto é a planilha. Até mesmo para ter acesso ao diretório onde fica gravada a planilha na rede do departamento é necessário a autorização do Teixeira. A planilha é importante demais para que qualquer pecador possa vê-la.

O pobre estagiário, Leal, que recém saído do ensino médio não conseguia entender como as pessoas ainda usavam como referência uma planilha feita na época da Guerra Fria, foi submetido a um verdadeiro tribunal de inquisição. Teixeira levou pessoalmente o assunto ao diretor financeiro. Tratou o caso como uma questão “de diretor para diretor”. Um castigo severo deveria ser aplicado naquele que tentou ir contra um dogma fundamental daquela corporação. Isso deveria servir de exemplo para os demais. Nunca, nem mesmo nas situações mais adversas, a planilha de Praxedes pode ser questionada.

Logo os demais membros da empresa tomaram partido de Teixeira. Afinal, também tinham fé na planilha. É claro, pois muita incompetência e erros eram escondidos ou camuflados com a desculpa: “mas eu fiz de acordo com a planilha do Praxedes”. Falado isso, estava encerrada a discussão.

Leandro Leal não teve seu contrato de estágio renovado. Como justificativa, a empresa alegou que ele não compartilhava de seus valores e princípios.

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