terça-feira, 30 de novembro de 2010

O papai noel e a carocha

Que as empresas são grandes fabricantes de “diz-que-me-diz” é fato consumado! Aliás, se as baias pudessem escrever um livro sobre as abobrinhas, groselhas, injurias, falsas promessas que ouvem, certamente produziriam textos muito mais divertidos em comparação com os do Causos Corporativos. Mais hilariante ainda, se pudessem debater entre si o que escutam diariamente dos corporativos. Porém, as baias não serão os personagens deste post, mas sim de algum próximo. Neste aqui, as groselhas serão classificadas de acordo com os seus prováveis autores, dentre eles: o papai Noel ou a carocha.
Formalmente, o jargão “conversa da carochinha” é definido como gênero de prosa e ficção, narrativa folclórica e história mentirosa. E nada mais mentiroso e folclórico do que a eterna promessa de Fernando do planejamento estratégico de que “vai largar tudo e abrir um quiosque na praia com a esposa”. Só vou acreditar quando eu estiver in loco. E como gostaria de vivenciar este momento! Presenciar a cena do corporativo padrão gerenciando seu quiosque na praia me proporcionará maior diversão do que qualquer banda de pagode ou meninas de biquíni que eventualmente figurariam por lá.
“Benzinho, você já formalizou por e-mail com cópia para mim o PO (purchase order) de 10 engradados?” “o pessoal da peixaria do Genival já se posicionou? Já formalizaram a cotação?”
“Já falou com o Tonico do cavaco? Quero e-mail com cópia para o chefe de banda . .ah, me copia em cco. Confirma o evento 21h sem delay!”
Banda no quiosque, cinco “gatos pingados”. “Amor, precisamos elevar o faturamento em 30% para bater o break-even”. Foco na porção de camarão e desestimular o temaki de lula (apenas um corporativo - e seu egocentrismo com traços psicóticos - teria a “brilhante” idéia de oferecer temaki em seu quiosque).
As conversas da carochinha são marcadas pelo seu tom fantasioso e geralmente são narrados pelos corporativos, sem muitas pretensões. Poderíamos perfeitamente denominá-las como “lendas corporativas”. Tão lendário quanto o Praxedes, o qual é sempre usado como exemplo para tudo por Teixeira nas conversas corporativas. Os lendários e épicos são aqueles profissionais que não existem.
Segundo Teixeira, o Praxedes tem duas graduações nos EUA, 5 MBA´s, pós-graduação em Westfhalenheim, Alemanha (a cidade deve ser fictícia também). Foi gestor por dez anos no Bank Merdon, diretor financeiro da “Joãoson e Joãoson” por cinco anos reportando-se diretamente para o CFO das Américas. Isso com 35 anos. Com 40, já era CFO mundial da Unieleven.
Quando vejo alguém versando sobre algum “super herói” corporativo, me programo para reduzir a pelo menos ¼. Dependendo do locutor, não acredito em nada! As vezes sinto piedade do Teixeira quando cria em sua mente um CV imaginário, apenas para expressar a trajetória profissional de seu sonho!
Talvez uma grande candidata ao prêmio “a carocha do ano” poderia ser a analista Mari, a qual se auto-promove, regularmente, dizendo que sempre recebe “proposta com salário muito melhor em departamentos mais estratégicos de empresas melhores”. Talvez a minha pergunta seja a mesma do leitor: então, por que não aceita? As vezes passo a crer que ela aplica aquele mesmo charme da adolescente menina-moça, quando conta para as amigas, que o Zezinho, o Luizinho e o Fernandinho estão afim dela. Mas ela não aceita ninguém, pois se considera muito superior. Fazendo a analogia, a Merdon, a joãoson e a Unieleven estão disputando “a tapa” uma tal de analista Mari. Mas ela não sai da Alpha! As propostas estão aquém da profissional que ela diz ser. Afinal, ninguém transporta dados do SAP para o Excel tão bem quanto ela! Ninguém faz tabela dinâmica como ela! Tabela dinâmica por cima, por baixo, de frente e de costa (peço desculpas aos corporativos: tabela dinâmica não, Pivot table). O mercado tem mais é de brigar por uma talent como ela!
Embora fictícias e sonhadoras, as conversas da carochinha não afetam tão diretamente sua vida profissional quanto as promessas de papai-noel. Tentadoras, agressivas e sedutoras, oferecem o maravilhoso mundo o qual você nem sequer chega perto e como conseqüência te frustra.
Dentre elas, a melhor, mais velha e famosa: reajuste salarial após um ano de casa. Dado que os orçamentos proíbem oferecer salário maior do que a mixaria que te foi proposto (da mesma forma você aceita, pois como todo bom corporativo, não suporta mais a atual a empresa), então o selecionador tira esta carta da manga no momento da entrevista.
Em minha humilde, radical, porém não esquizofrênica opinião, o maior defeito dos corporativos começa neste ponto: quando ressentem, subjugam e desmerecem os seus respectivos proventos mensais. A troco de que pessoas se enjaulam 14 horas por dia? Sinceramente, acredito que não há quantias financeiras que satisfaçam tão longa dose de esforço diário.
Se não há prazer e satisfação em relação à atividades, funções e ambiente, não há remuneração bastante. Comentário do tipo, “se eu ganhasse uns 30 mil por mês, tudo bem” perde a validade quando de fato se começa a ganhar 30 mil por mês. A insatisfação tem outra causa, porém a culpa é do salário! Entre as conversas da carochinha do gênero, prefiro acreditar naqueles que colocam, em seus discursos, o jargão “não há dinheiro que pague”!
Culpar o salário é alienar-se e cegar-se para as mazelas e insatisfações corporativas e, além do mais, para um corporativo padrão, quanto maior seu salário, maior e mais sofisticado é o instrumento alienante que pode adquirir, tais como carros de luxo, confortos desnecessários e fúteis, tudo que o faça esquecer a vida escravocrata e sem sentido que leva. Afinal, dado que se trabalha 14 horas/ dia, restam apenas 10 para atividades que não trabalho. Três horas de translado, 1 hora de refeição noturna e seis para dormir. Resumo: o mundo corporativo é a escravidão do século 21.
Menos importante, porém não irrelevante para o presente é a "promessa de estacionamento". E aqui proponho uma dica: caso te deram prazo de um mês para a famigerada vaga, pechinche um plano anual no estacionamento ao lado. Se o prazo para uma vaga é indeterminado, então esqueça! Jamais guardaras a sua coisinha popular em meio aos cayennes, Tucson, A6, A7, A8, A5000 dos amáveis gestores da Alpha.
O papai noel corporativo atua bem também nos campos de viagens corporativas internacionais. Trainees, analistas e pequena gerência (os miúdas) são sempre atraídos pela “projeção internacional”ou pelos “treinamentos no exterior”. E então se sentem obcecados e atraídos por aquele mundo encantado e sem fronteiras, acreditando que de fato serão levados pelo trenó do bom velhinho às terras longínquas e desenvolvidas.
Trenó este que levam também os aspirantes! Mais especificamente, os estagiários! Vestido de terno, o bom velhinho convida o novato à entrevista, na qual sempre entoa o seu famigerado discurso promessa: “após o fim do contrato, há grandes chances de efetivação . . veja a Luciana Hauber (analista de recrutamento, sempre presente - a arroz de festa das entrevistas), ela adentrou na Alpha como estagiária, foi efetivada e hoje faz parte da equipe da gestão de pessoas”
Não há como lutar contra fatos! Basta calcular a relação entre estagiários contratados por multinacionais e os realmente efetivados naquela. E, então, automaticamente direcionam a óbvia, porém ingênua contra-argumentação: “claro, só os talentos são efetivados!" No começo da minha carreira, carregava esta máxima comigo também. E, francamente, gostaria de perpetuar com ela. Porém, novamente, o mundo corporativo violentou mais um de meus prematuros sonhos profissionais: efetivação graças ao esforço!
Quando não efetivado para suprir uma necessidade imediata, o estagiário precisa de duas grandes sortes, tendo ambas atuando simultaneamente: primeiramente, cair nas graças de seu superior direto e assim tornar-se seu afilhado corporativo e a segunda e derradeira: que seu padrinho corporativo seja alguém influente. Há certa “meritocracia” na primeira exigência, muito embora o “cair nas graças” no universo corporativo geralmente não se dá em planos racionais e objetivos, mas sim em esferas políticas, subjetivas e emocionais, do tipo: “o chefinho foi com a sua cara”. Porém o segundo requerimento é pura “sorteocrácia”: jamais terás o luxo de escolher seu superior direto em uma entrevista.
Na mesma classe de anedotas encontra-se “A sua chance de crescimento nesta área é muito grande. ..tudo vai depender de você”. Desenvolvimento profissional?! Não, claro que não! Quando ouço este famoso jargão em uma entrevista, sinto que o meu futuro chefinho já está pensando em jogar a conta da patifaria político-corporativa nas minhas costas! Desde quando a ascensão de alguém depende apenas do próprio esforço, competências e habilidades? Desde quando a chance de crescimento é grande? Desde quando alguém espera pelo seu crescimento? O auge de seu esforço é apenas o ponto de partida: sem este, será muito difícil conquistar pelo menos o mínimo de respeito.
Caso já esteja pensando em sugerir instalação de detector de mentiras no departamento, venho novamente com más notícias: o gerador de lero lero corporativo não para por aí! Aliás, a título de introdução à malandragem corporativa, foram apresentados apenas os mais brandos e simpáticos papai-noel e carocha. Mas que os outros personagens do gênero das anedotas não se sintam injustiçados: em próximas postagens, entrarão em cena, o vigário, o super.man@alpha.com e o joão.sem.braço@alpha.com!

sábado, 27 de novembro de 2010

O conto do vigário - meu divórcio com o mundo corporativo

Tal como feito em outras postagens, refleti muito sobre como intitular aquilo que tentaria descrever. Estive pesquisando a respeito da origem do termo “conto do vigário” e algo me chamou muita atenção. A palavra vigarista originou-se desta expressão e não vice-versa. E não teria melhor palavra para definir a atitude da Alpha para comigo, quando lá participei de um processo de seleção. Não temos, aqui, o intuito de utilizar o blog como o “muro das lamentações”. Opostamente, este tem sido alimentado por conteúdo que propõe profunda reflexão sobre os malefícios proporcionados pelo enganoso ambiente corporativo.
No entanto, foi graças a uma atitude extremamente vigarista do cafajeste mundo corporativo que minha carreira tomou rumos responsáveis por mudanças bruscas em meu destino. Talvez, graças a este expediente, sinto que, atualmente, ganho horas saudáveis de vida divagando e escrevendo sobre o tema, para que de alguma forma ajude a sanar o processo de completa alienação que 95% dos corporativos atravessam. Sendo assim, tomo a liberdade, de relatar um fato pessoal para melhor ilustrar como se dá a vigarice corporativa em suas nuances mais perversas.
Atuava em determinada empresa, mas não me sentia muito confortável por lá. Não me dirigia ao mercado, entretanto, fui contatado para uma proposta na Alpha. Primeiramente, entrevista com Luciana Hauber, a analista de recrutamento; Uma semana depois, fui contatado para “conversa” com Fernando do planejamento de novos negócios, área a qual atuaria; Após 4 dias, nova entrevista, desta vez com Fernando e seu chefinho diretor. Embora desconfortável na empresa onde atuava, estava tranqüilo sobre o provável resultado daquela entrevista. Talvez a única expectativa minha naquele momento era a saída da zona de desconforto. No entanto, aquilo não me fazia muito ansioso.
Passados dez dias, recebo um telefonema de Luciana Hauber parabenizando-me pela aprovação no processo. Embora o salário deste novo seria 120% maior, o que me fez realmente muito feliz, foi o fato de sair de um lugar extremamente desagradável, sem perspectiva e sem estabilidade, para uma área em que me identificava melhor.
Ao longo daquela semana, passaria por aquela cerimônia burocrática de entrega de documentos, pedido de demissão e etc. Porém, meu erro fatal: em um surto de alívio e desabafo, comuniquei, imediatamente após recebimento da notícia, minha saída ao chefinho. Lembro, como se fosse hoje, aquele semblante vermelho e inchado, com traços profundos de obesidade cardíaca certamente proporcionada pela vida corporativa, tentando me agredir ou hostilizar de alguma forma sutil, por causa de meu abandono naquele momento.
Igualmente sutil, tentava responder que diversas vezes havia sido abandonado também como profissional. Bombardeios morais iniciaram-se então: primeiro disse que não iria me demitir. Por mim, sem problemas! Embora corporativo, não era miserável, nem de espírito, nem de grana. Meus princípios e valores familiares a respeito do trabalho sempre me fizeram ignorar a ridícula, assistencialista e antiquada CLT. Abria mão, sem qualquer tentativa de contra-argumentação dos 40% de multa, também conhecido em ambientes decentes, como a esmola; Bem como de meu FGTS. Em seguida, um pouco mais agressivo, disse que havia muitos contatos corporativos e que segundo a visão dele, eu estava sendo muito precipitado e isso poderia me prejudicar.
Com os seguintes dizeres, me atacou: “tenho 25 anos de mercado. .. talvez a sua idade de vida . .As vezes, quando jovens, nos deixamos iludir por aquilo que vemos! Mas exatamente aquilo que não vemos. . .o mundo paralelo e não tão bonito e límpido da juventude . . nos puxa o tapete . . .e após um tombo desses, meu amigo, levantar-se é muito difícil! Você consegue, é claro! Mas nunca na mesma posição em que poderia estar! A decisão é sua e você paga as conseqüências dela! Precisa de tempo para pensar? Bom, já que não precisa, então, nossa conversa está encerrada por aqui. Se você me der licença, preciso entrar em contato com alguns colegas, além de providenciar seu bloqueio de e-mail e diretório. Só peço um simples favor: que você consiga passar tudo que for possível para seus estagiários e assistentes. Você poderia também, por favor, enviar e-mail solicitando ao RH um novo recurso em seu lugar?”
Sei bem o quão triste é, mas isto não me abalou! Ao longo de minha trajetória profissional, nunca soube ou conheci verdadeiramente, como seria trabalhar sem assédio moral. Desde estagiário até minha última colocação no mercado, sempre fui moralmente lesado. Em momentos extremos de minha carreira cheguei a achar tudo aquilo muito normal. Em minha visão, estas atitudes faziam parte do pacote “pressão do mundo corporativo.”
Mas, pasmem! O pior estaria por vir! Cumpri todas solicitações supracitadas daquele malvado que se tornaria, em três dias, meu ex-chefinho, enquanto levava minha documentação à Alpha. Acordei com Luciana Hauber de telefonar quinta-feira pela manhã de modo a agendar meu exame médico.
Pontualmente, quinta-feira as 8h30, liguei para Luciana. Esta me comunicou que naquela semana não seriam realizados mais exames e solicitou meu aguardo até terça-feira pela manhã, quando deveria contatá-la novamente. A princípio fiquei contente com a possibilidade de descansar até segunda-feira.
Eis que quando ligo na terça, a bombástica, derradeira e devastadora notícia: infelizmente, a vaga havia sido preenchida! Eles lamentaram o incidente e se desculparam pelo ocorrido, não permitindo que eu esboçasse qualquer indagação a respeito do que havia ocorrido. Fiquei atônito! Tentava argumentar, dizendo que já havia pedido demissão da antiga, porém em vão! Luciana foi contundente: “ordens formais da diretoria financeira.”
Até hoje sinto-me confuso a respeito disso. Uma vertente minha adepta da teoria da conspiração acenava fortemente para um provável serviço sujo do meu ex-chefinho. Outra mais realista aponta para uma possível indicação formal pela diretoria de outro profissional. Provavelmente, o Paulinho filho do amigo do diretor!
Não havia e-mails e nem provas da vigarice. Mais do que desempregado, me sentia humilhado! Aquilo me ardeu muito e me proporcionou pelo menos um mês de depressão. Não tinha a menor motivação, mesmo de sair da cama. Até o som da TV me perturbava. Após o fato, declarei-me divorciado do mundo corporativo, pois tenho a legítima convicção que aquilo ocorrido comigo é regra e não exceção! Cheguei a conclusão do quão decepcionante e prejudicial é trocar minha honra e milhares de reais investidos pela minha família em minha formação apenas pelo glamour de dizer que faço parte da equipe de talentos de algum antro corporativo.
E de fato estou certo! Sinto que, por estarem alienados, corporativos desprezam sua capacidade de empreender e serem proprietários exclusivos de seus destinos sem necessidade da estabilidade glamourosa das multinacionais e muito menos da assistencialista e degradante CLT. Em um ambiente que predomina a “troca de horas por dinheiro”, quem compra os dias de vida mal vivida de um profissional – no caso as empresas - tem a barganha de ser imoral e cafajeste.
E a barganha é legítima, pois o produto “horas” não possui diferencial nenhum e é facilmente substituído. Entretanto, muitos corporativos “talentosos” ainda não entenderam que embora consigam produzir algo tão diferenciado e valioso chamado resultado ou performance, preferem comercializar (em um mercado já saturado) seu produto menos valioso, as horas formais de trabalho com um comprador perverso e poderoso, o qual as detém em troca de uma mixaria, que é a suposta estabilidade.

domingo, 7 de novembro de 2010

Minhas férias

Vamos reconstruir:
1- O Drama. Antes de agendar sua viagem de férias, o colaborador precisa conversar com seu superior sobre a melhor época pra descansar. E o superior SEMPRE vai fazer um drama maior que filme iraniano. Nunca dá pra tirar 30 dias. Nunca dá pra tirar 30 dias seguidos. E aí o colaborador, com medo de ter seu nome esquecido praquela vaga do analista sênior que vai se aposentar no final do ano, fala que tá atolado de trabalho e por isso não quer tirar mais que uma semana.
2- A contagem regressiva. Tal qual o aluno da 4ª série que faz uma contagem regressiva para o início das suas férias escolares, o colaborador também fica na expectiativa do período de liberdade (mesmo que de apenas uma semana). Mas essa expectativa não pode ser guardada apenas para ele. Ele tem que divulgar a todos que sairá de férias, ou “estará saindo de férias”, talvez uma maneira de fazer os outros sentirem inveja, ou testar sua popularidade. Para isso, nada melhor que o MSN. Adotou-se como convenção, colocar essa contagem regressiva no nickname – Lu - Countdown 12!! Ou Renato – faltam 12... ou até mesmo Carlos – 12 dias para o paraíso!!!. Há aqueles que aproveitam para soltar ao mundo o local de suas férias: - Ju – 12 dias!! Salvador HERE I GO!!!
3- A preparação. Quando o período de suas férias começa a se aproximar, é preciso intensificar os avisos de que você estará de férias. Em todas as ligações o colaborador avisa que na próxima semana estará de férias e por isso pede para que contate seu supervisor, ou colega. Mesmo que ele saiba que a pessoa não vai mais entrar em contato. E não são apenas colegas diretos que devem ser avisados. O gerente do banco é avisado. O motoboy é avisado. A secretária do cliente é avisada. A faxineira é avisada. O gerente de uma outra área vem pedir uma tarefa trivial na segunda-feira e a reposta é: “hmm para quando você quer isso?” - “sei lá, pode ser amanhã”. “Ah bom, por que se fosse pra semana que vem não ia dar por que ESTAREI DE FÉRIAS”. Ou ainda: “Carlos, que dia é hoje mesmo?” – “Cara, você pode ver isso com o Fernandão, to enroladão aqui porque vou SAIR DE FÉRIAS ESSA SEMANA”
4- O out of Office assistant. Todo mundo que tá de férias quer contar pra todos que está de férias pra mostrar que é fodão, trabalhador e merecedor (mesmo tendo arregado pro chefe e pedido apenas uma semana). É aí que entra essa ferramenta espetacular chamada Out of Office Assistant, ou Email de Resposta Automática. Vale uma aprofundada nesse tema posteriormente, mas de maneira geral, posso dizer que sempre se deve colocar uma língua a mais do que a que você utiliza nesse email. Se vc só usa português no dia-a-dia, coloque em português e inglês. Se utiliza português e inglês, coloque em português, inglês e espanhol, terminando com um saudoso “saludos”.
5- A volta das férias. A volta das férias pode ser dividida em duas situações. A primeira é que todo mundo tem que mostrar o quão importante é, e quantos emails vc recebe por semana. Todo mundo inicia seu primeiro dia de férias com “Meu DEUS 472 emails não lidos!!!” e faz piadinhas ao longo do dia tais como “calma aí que só faltam 173 emails pra eu ler”, mesmo sabendo que desses 472, 320 são do e-groups dos seus amigos do carnaval. A segunda situação é mostrar pra onde vc foi. O colaborador tem que mostrar que foi pra longe e subir suas fotos na sua página da rede social no mesmo dia. Não pode perder o timing, senão ninguém vai comentar com o já tradicional “Ai que inveja”.
6- A depressão. Voltar de férias e trabalhar pode ser comparada a situação de um presidiário que deve voltar a cela depois dos seus minutos ao sol. A depressão vem forte. Você não pode mais usar bermuda. Você não pode mais acordar tarde. Você não pode mais beber cerveja no almoço. Tem gente que chora. A ficha cai e aquele paraíso que você achava que era a vida, não existe mais.
7- Voltando ao normal. Quem viaja de férias volta mais alegre, sentindo que a vida é linda, volta com centenas de planos para uma vida melhor. “Nessas minhas férias vi que devemos ter mais qualidade de vida”, “não vou viver apenas trabalhando”, “vou encontrar toda semana o pessoal da minha viagem”. E após uma semana, o colaborador nem lembra mais que tinha esses pensamentos. E volta pra rotina, acordar, pegar trânsito, trabalhar, pegar trânsito, dormir.

Um mestre na arte de ler gráficos

Renato Medeiros foi contratado para ser o novo Diretor do Departamento de Finanças da empresa Alpha. Formação em uma das principais faculdades do país, MBA na França, experiência de mais de 10 anos no mercado e enorme capacidade de liderança foram os atributos anunciados pelos General Manager. Certeza de “agregar muito ano négócio e contribuir para o crescimento da empresa”. Mas a principal habilidade de Renato não foi anunciada: sua incrível habilidade em analisar gráficos. Na primeira reunião, juntou sua equipe para falar sobre os números da Análise de Desempenho do ano anterior. Pulou todo os slides com textos e foi direto pra sua área de maior interesse, os gráficos. Conseguia ver como poucos, os meses com desvio de performance. Apontava com certeza de um rei absolutista os períodos críticos e os números abaixo do ideal. Era mestre em levantar pontos suspeitos e não havia slide com gráfico sem um único comentário seu. Nessa reunião solicitou total atenção ao trabalho nos meses de setembro e outubro. Mais uma reunião, gerente de planejamento apresentando os objetivos para o próximo ano fiscal, lá vai Medeiros apontando os meses com crescimento mais baixo. “Opa, por que não crescemos em março o mesmo que em janeiro?”. E toda a equipe volta para rever os números. Medeiros sabia como ninguém ler os gráficos. Tinha certeza de que havia nascido para isso. A tela do seu notebook não tinha espaço para planilhas de Excel e documentos de Word. Apenas gráficos do Power Point. Em todas as reuniões, ele apontava aqueles detalhes que somente ele sabia. Tinha olhos de falcão e faro de doberman. Não era fã de curvas de crescimento. Um mês não podia ser melhor que outro. Produtos não podiam ter o mesmo share. Foi aí que sua equipe percebeu. Chega de trabalho. 5% de crescimento de janeiro a dezembro. 30% de share para todos os produtos. 20% de lucro. 20% de custo fixo. Lead-time idêntico para todas as entregas. E Medeiros e todos os demais viveram felizes para sempre.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A fantástica vida do diretor Lacerda

Quando conheci o diretor Lacerda, responsável por toda a área do Cone Sul de sua unidade de negócios, ele tinha 42 anos. Formado em engenharia na Poli-USP, Lacerda também tinha MBA por Harvard e era mestre pela London Business School. Na sua longa e meteórica trajetória profissional, acumulava promoções e mais promoções, sucessos e mais sucessos.

Para Lacerda, o trabalho não podia esperar. Chegava ao escritório todo dia às 7h30 da manhã. Enquanto ligava o computador, já tomava um belo copo de 300ml de café. No almoço, sempre mais tarde do que os demais funcionários, quando não pedia um lanche no escritório mesmo, comia um salgado e bebia uma Coca-Cola no café do prédio. Rapidamente. 20, 30 minutos no máximo.

Trabalhava, trabalhava, trabalhava. Muito competitivo e competente, gerava lucro e mais lucro, ano após ano. Conseguiu dobrar o tamanho de sua área em pouco menos de 2 anos.

Se chegava às 7h30, poucos dias ia embora antes das 20h. Bem remunerado, morava numa bela mansão no Km 32 da Raposo Tavares, a pouco mais de 1h do seu trabalho. Apesar de duro, todos gostavam muito dele. De sua competência e sua forma de trabalhar.
Minha primeira impressão era o senso comum. Mas, aos poucos, passei a perceber alguns “detalhes” de sua vida. Minha baia era ao lado de sua sala, o que me fez presenciar alguns momentos delicados e um tanto quanto constrangedores.

Certa vez, o pessoal da matriz americana viria a São Paulo para discutir alguns pontos e conhecer melhor a equipe. Coincidentemente, era a mesma semana da formatura do 3º colegial de sua filha mais velha. Lacerda não foi ao evento. Claro, mandou o motorista da empresa buscar a sua família em casa, pontualmente, e pediu para sua secretária levar flores para sua filha que tanto amava.

Alguns meses depois, vi que ele discutia ao telefone com sua filha mais nova, 15 anos de idade. O motivo: foi pega saindo do seu condomínio de luxo fumando um baseado com mais algumas amigas. Lacerda era diretor. Influente, conhecia gente importante. Sua imagem era a imagem da empresa. Perderia muita credibilidade se sua família estivesse vinculada a drogas, polícia, processos judiciais. O pessoal do jurídico trabalhou rápido e resolveu a questão.

As discussões com sua esposa eram mais comuns. O motivo, apesar de não estar explícito, era sua ausência. Ele nunca estava. Nunca podia viajar, sair, acompanhá-la. Seus 110kg e sua vida desregrada prejudicavam seu humor e disposição. Que mulher agüentaria tanto desprezo? No fundo, ela tinha tudo que queria (bolsas, jóias, sapatos), menos a companhia de Lacerda. Facilmente suprível pelo personal trainer que a companhia pagava para ela.

Numa manhã fria e ensolarada de inverno, chegando ao escritório, Lacerda sentiu um mal súbito. Mão no peito, camisa aberta, helicóptero de seu seguro saúde ultra-prime. Lacerda deixou uma esposa, duas filhas, R$ 5 milhões na conta e uma vida mal vivida.