domingo, 17 de janeiro de 2010

MINHA DINÂMICA NO BANK MERDON


(Cabe ressaltar que o nome da empresa é totalmente fictício, de forma a evitar qualquer utilização de direitos de imagem da verdadeira instituição)

Anestesiado após minha aprovação no vestibular, parecia, naquele momento estar respirando ares de dono do mundo. Simplesmente aprovado em um dos melhores centros de estudo de negócio da América Latina, compartilhava com meus novos colegas, o sentimento de que estaríamos próximos de um futuro deveras promissor.
No primeiro momento não tinha a exata noção do que seria um futuro promissor dentro de uma faculdade de administração, mas tinha certeza que o meu seria. E então, em um daqueles dias ociosos de começo de faculdade, estava circulando pelos cantos de lá, quando avistei um cartaz grande, verde e bonito, com a foto de alguns jovens elegantes, bem vestidos (de forma corporativa), sentados trocando idéias ( em bom “corporatês”: eles estavam em um brainstorm) sorridentes em frente de um computador; Acima havia uma mensagem bem grande: “venha fazer parte da equipe de jovens talentos do Bank Merdon”.
Parei e fiquei observando por algumas dezenas de segundos. Parecia, naquele momento, estar diante do que verdadeiramente poderia ser um futuro promissor. Uma confusão de imagens e mensagens: jovens talentos + bank merdon + trocar idéias + ternos e gravatas + fazer parte da equipe. Deixei escapar um espontâneo sorriso, do tipo “já sei onde é o meu lugar”. Coloquei-me naquela posição; terno e gravata, decidindo o futuro do Bank Merdon junto com meus colegas de Merdon (todos talentos – só os melhores do futuro reunidos, os gênios unidos), sorridentes (o sorriso seguro da certeza do poder), na frente da tecnologia (um laptop – naquela época, este benefício era destinado apenas a presidentes) e certo de estar realizando o futuro promissor.
As vezes me flagro relembrando a idéia que tinha do mundo corporativo e ora dou risadas ora sinto uma vergonha imensa. Uma ingenuidade a beira do absurdo: em minha mente, uma vez que havia sido contratado a título de talento com potencial, adentraria como estagiário, não para exercer atividades profissionais, mas sim para entender e aprender processos de forma a associar com os ensinamentos de uma faculdade de ponta tão requerida por uma instituição como o Merdon.
Imaginava que, por vezes, diretores e vice-presidentes fariam o papel de verdadeiros tutores, chamando-me em suas salas para ensinar um pouco com suas experiências, de modo a me encantar com seus conhecimentos e sabedoria sobre o mercado e o mundo dos negócios. E então, depois de algum tempo naquela instituição, o meu futuro gestor me chamaria para comunicar que, como eu já havia passado por todas minhas etapas de preparação, eu estaria apto para exercer atividades profissionais no Bank Merdon. Naquela época não tinha a ínfima noção do que seria “orçamento para efetivação de estagiários”, “demissão de analistas plenos e efetivação de estagiários como analista Junior para realizarem mesma função, devido a corte no orçamento” ou “estagiários subordinados à analistas plenos, para dar suporte (e suportá-los) nos trabalhos maçantes.”
Chegou o segundo ano da faculdade e não perdi tempo. Assim que avistei o cartaz do programa de seleção de jovens talentos do Bank Merdon, logo me inscrevi no site. Aguardava ansiosamente pela resposta e naquela época alguns de meus colegas já conseguia o primeiro estágio. Lembro que um deles havia sido aprovado no processo de seleção de estagiários do Bank Merdon. “Caramba, o Leandro Leal “tá” na Merdon!!!” Evocávamos eu e meus colegas.
Em paralelo, já aprendia alguns conceitos de gestão de pessoas, tais como perfil. Olhava para o tal de Leandro Leal e pensava: o perfil do Leandro é o do Merdon, e portanto deve ser o meu, caso queira o futuro promissor. Se eu não ser aquilo que o Merdon procura, exatamente o que o Leandro é, meu futuro não será promissor. E então, passei a analisá-lo, buscando nele, características pessoais, que possivelmente seria de agrado dos gestores da Merdon. E, francamente, eu não encontrava algo específico.
Pouco depois, outro colega havia sido aprovado no processo do Shitbank. Estávamos naquelas rodas de conversa de alunos antes da aula e, enquanto trajava camiseta e bermuda, vindo do clube, meus colegas de Shit e de Merdon, já vestiam ternos e portavam suas pastinhas. Enquanto eu falava sobre futebol, mulheres, academia e cerveja, os dois debatiam sobre as vantagens de ser do “front” e as desvantagens de ser do “back.”
Lembro que as vezes me sentia um garotinho perto destes verdadeiros executivos de 18 anos. Não fazia a menor idéia do que seria isto. Mas o dia do meu futuro promissor estaria perto. Eis que recebo um telefonema do Merdon, me comunicando que havia sido selecionado na fase de triagem de CV e agendando a etapa da dinâmica de grupo! Veio-me, então, aquela sensação de vitória do começo do texto; Ares de dono do mundo me encontravam novamente. Se eu seria front, back ou raio que o parta, dane-se, eu seria do Merdon: bem vindo ao convívio dos eleitos, portas abertas, Green card, chamem do que quiserem. Tal como quando passei no vestibular, fomos eu e minha família jantar em um restaurante para comemorar. Hoje, sinto muita vergonha disso!
Mas, enfim, é chegado então o esperado dia da dinâmica de grupo do Merdon. Um verdadeiro Big Brother Corporativo, no qual o prêmio é o início do futuro promissor. Lembro de todos os detalhes daquele dia. Minha primeira dinâmica, primeira vez de terno indo para o mundo corporativo – um homenzinho, o executivozinho do Merdon! Mesmo que fosse do shit. O Significado é o mesmo, um passo para o poder, para a ostentação e o glamour.
Não me incomodei nem um pouco com o trânsito – aliás, achava divertido dividir espaço junto com corporativos nos longos congestionamentos. Da mesma forma, não me foi incomodo pagar R$ 20,00 o estacionamento sem qualquer reembolso dos pobres coitados da Merdon. Tudo era alegria! Mal podia esconder minha felicidade ao entrar naquele conjunto imponente de edifícios.
“Se segurem, o Jack Welsh chegou”, pensava comigo ao me deparar com os demais candidatos sentados nos sofás do saguão a espera do chamado para a dinâmica. Embora já tenha se passado quase sete anos daquele dia, consigo lembrar mesmo dos detalhes mais irrelevantes. A conversa do saguão foi um show de bizarrice: os melhores CV´s de aspirantes de São Paulo querendo contar suas vantagens, uns aos outros.
Entre nós, aqueles já com experiência profissional detinham mais moral. Afinal, “só” faltava isto para a maioria dos “geniozinhos” lá presentes. Ah, lembrei . . . havia a turminha que cursou o colegial nos EUA (estes eram os “senhorezinhos” do conselho – batam continência). Quando me lembro da empáfia daquela garotada, fico pensando como devem ter sidos os primeiros meses deles como estagiários.
Uma glamorosa humilhação! Papai gastou fortunas para formá-lo e, por ironia do destino, o tal do futuro promissor está agora nas mãos do Sr. Adolf Teixeira, o supervisor. Uma formação sofrível, uma linguagem terrível, requintes de crueldade, péssimo caráter somados a um egoísmo e egocentrismo ímpar.
Hoje chego à conclusão que verdadeiramente este é o tal do “futuro promissor.” Foi minha dificuldade no passado e sinto que os atuais aspirantes a corporativos confundem muito sobre o conceito de futuro promissor. Na maioria dos casos, quem o define é a própria faculdade, a família e a sociedade – e acredite, este é o começo do apocalipse: terceiros escolhendo seu destino; Quando adentra à empresa, outros terceiros escolhem a continuação de seu destino, traçam sua carreira e te induzem a pensar igual a eles sobre o que é bom para você. De fato, passa a crer que aquilo realmente é bom e, em conseqüência, o que diverge é o caminho do mal.
Mas como sempre adverte a analista Mari: “não vamos perder o foco”. Luciana Hauber, a analista de recrutamento, uma mulher elegante, corporativa e simpática adentra a sala com um bom dia convidativo, oferecendo água e café a todos.
Aquele ambiente era ótimo: uma sala de reunião confortável, requintada e tudo corporativamente bem ajustado, com os melhores corporativos juniores de São Paulo figurando junto com Luciana Hauber (o futuro chefinho, o gestor de fundos Adilson Franco, chegaria minutos depois para completar o elenco da peça teatral – um corporativo que se preze sempre chega atrasado a reuniões não importantes, pois estava envolvido em problemas relevantes – por mais que ele estivesse vendo vídeos de sacanagem em seu computador).
“Pessoal, bom dia a todos meu nome é Luciana, sou da área de “recruitment & career” do Bank Merdon, estamos começando mais um processo de seleção de novos talentos do Merdon. Este programa é uma ótima oportunidade para se iniciar uma carreira em uma instituição de renome. Nosso intuito aqui não é preparar os melhores estagiários, mas sim grandes profissionais para o mercado. Eu posso afirmar isto com convicção, pois também adentrei aqui em um programa de seleção de talentos e sei bem o quanto aprendi nestes dois anos de Merdon.”
“Estamos selecionando estagiários para a área de fundos. O Adilson -gestor da área- participará também da nossa dinâmica. Infelizmente ele não está ainda presente, pois acabou de retornar dos EUA. O A.F. esteve uma reunião com diretores em Merdon durante a semana toda e pelas informações que tenho, o vôo dele atrasou.”
Antes que ele chegue, vou dar algumas dicas quanto ao Adilson. Ele é uma pessoa de espírito jovem, super mente aberta, bem “easygoing”. Aproveite bastante este oportunidade para perguntar todas as dúvidas a ele. Eu o conheço bem e sei quue terá o maior prazer em respondê-los
Lembro bem, o quão boquiaberto eu fiquei! Sinto que naquele momento eu parecia uma garotinha ingênua e virgem sendo seduzida pelo fantástico mundo de Merdon (as empresas seduzem a garotinha virgem à uma noite romântica, a estupram com voracidade e depois a manipulam a pensar que aquilo é o amor; uma garotinha virgem jamais se voltaria contra o imponente reprodutor que a “ama” com muita voracidade).
Imaginem eu em Merdon tomando decisões junto com meus colegas gringos sobre os rumos do Bank Merdon, vôos internacionais, falta de tempo. . . o que era suspeita, naquele momento tornou-se certeza, Merdon era o tal do futuro promissor. O A.F. tornar-se-ia repentinamente meu senhor, meu pastor, proprietário exclusivo de meu futuro.
Luciana Hauber pausou um pouco a dinâmica para que aguardássemos a tão esperada chegada do príncipe. “A.F. ?!?!!? Nossa, o cara é foda!” Comentávamos todos em voz baixa sentados tomando água e café. Eis que Mr. Adilson Franco entra na peça. Só faltaram lágrimas e aplausos por parte dos aspirantes. Este foi o primeiro show business de minha vida.
A.F. e Luciana Hauber se cumprimentam e começam a conversar entre si, mas voltados a nós. Achava demais o mundo corporativo, mas não entendia o verdadeiro significado daquela irradiante simpatia contracenada pelos dois, com conversas agradáveis, sorrisos em excesso e piadinhas corporativas para divertirem os aspirantes. Realmente não sabia que aquilo era um teatro. Em minha mente, eles eram naturalmente assim, pois eram pessoas diferenciadas e melhores, afinal foram escolhidos pelo Merdon.
Hoje sinto muito vergonha da minha ingenuidade. Mas enfim, o teatro começou: palhaços a posto, que a prova do líder vai começar. Aspirantes divididos em grupo, estudo de caso na mesa, A.F. e Luciana assistindo e anotando. Aquele jogo de oito contra oito era bizarro. Havíamos um tempo para ler o estudo de caso e depois começaria o “brainstorm” igual àquele do cartaz.
Mesmo entre nós aspirantes, o tal do “brainstorm” não era lá tão inocente quanto àquele. Recordo-me de quase todas as vezes que tentava falar, um ou outro me interrompia com suas tacadas de “gênio” (ou de mal-educado), não me deixando qualquer reação. Então me questionava se de fato aquilo era um trabalho em grupo ou a competição de quem falava mais ou de quem conseguia concluir o raciocínio sem intervenção de ninguém.
No mínimo, estava um pouco distante daquilo que poderia se considerar “trabalho em grupo”. Mais bizarro era quando Luciana Hauber passava pelos grupos! Mesmo aqueles mais quietos procuravam se exaltar, falar, argumentar, discordar e profanar. Naquele momento passei a perder o respeito pelo verdadeiro intuito da atividade. Então minha única defesa, seria discordar e fazer prevalecer minha idéia, mesmo que a do meu companheiro fosse melhor. Assim como todos faziam. Aquilo me remetia ao que seria a Torre de Babel, talvez a Junior. Anos depois eu vim a conhecer a Torre de Babel profissional.
Enquanto isso, no melhor estilo “Bolanos e sua prancheta” (vide texto anteriores), A. F. apenas anotava. Então quando faltavam cinco minutos, uma mente supostamente sã de nosso grupo, alertou para concluirmos rapidamente, pois restava pouco tempo. Por tempos achava que isto era um perfil de liderança e voltado para resultados; após umas cinco dinâmicas percebi que o melhor nome para aquilo era “malandragem” de alguém experiente em dinâmicas.
O final da dinâmica foi um verdadeiro “gran finale” desta peça; um grupo contra o outro! Todos queriam se mostrar o quanto pudesse para A.F. Este apenas fazia algumas questões pontuais, nada que exigisse muito conhecimento. Lembro uma garota, perfil “analista Mari”, discutindo em alto brado com o estrela da dinâmica, perfil “estagiário nerd” – cursava Faculdade Gurmecindo Vera, colegial na Alemanha, fluência em inglês e alemão e papai era diretor do Banco Surreal.
Enquanto o colega discursava com ar de superioridade, a garota, também da Gumercindo Vera o interrompeu com “desculpa fulano, mas não é isso que o Adilson e a Luciana querem ouvir.” Adilson a interrompeu e rebateu: “fulana, vocês não devem dizer coisas para agradarem eu ou a Luciana, mas apontar soluções em que a Merdon seja beneficiada”. Tenho certeza que uma dinâmica como esta teria enorme audiência em várias redes de TV.
“Pessoal, acho que vocês já devem estar exaustos com esta manhã repleta de atividades conosco. Saliento que temos urgência na conclusão do processo e acredito que até o fim da semana vocês já terão um feedback. Gostaria de perguntar se alguém tem alguma questão sobre o processo ou até mesmo sobre a Merdon”
Não tinha nenhuma dúvida, ninguém também. Não fui aprovado, não sei quem foi. Confesso que a sensação de rejeição por conta da reprovação foi dolorosa. Na verdade a dor da rejeição é a contra partida da felicidade de quem entra na Merdon. Depois de tempos aprendi que esta sensação de grande felicidade ou grande tristeza não se deve a uma competência ou incompetência para adentrar na instituição, mas sim à expectativa que se cria (tanto você, quanto sua família e mesmo os colegas de faculdade) a respeito da instituição.
Uma grande expectativa na família é criada, pois entrar na Merdon seria a certeza de que o investimento em seu filho obteve frutos (o fruto que se colhe em uma instituição Merdon é o grande alvo de críticas deste blog). E então aflição de anos de várias famílias, noites de insônia de dezenas de jovens e o tal do futuro promissor são decididos por uma gincana medíocre e uma conversa de dois minutos entre um tal de A.F. e uma jovem iludida por aquele fantástico mundo de Merdon. Depois de anos, tive a felicidade de chegar a conclusão de que só tem futuro promissor aquele que tem coragem e discernimento para decidir o próprio.


quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Mandamentos corporativos (paranóias)

1-) Bloqueie computador até mesmo quando for pegar algo na impressora;

2-) Evite reações – mesmo que involuntárias – inusitadas ou bizarras. Segundo você mesmo e sua síndrome de egocentrismo, sempre alguém te observa;

3-) Tome muito cuidado com as cópias ocultas; sempre coloque alguém em cópia oculta

4-) Quando estiver defecando, apenas saia da casinha quando certificar-se que não há ninguém no banheiro. Mesmo trancado lá, jamais , sob hipótese alguma, solte gases em alto brado. Se alguém te pegar nesse contexto, certamente seu trato com esta pessoa nunca mais será o mesmo

5-) Jamais diga algo comprometedor em território corporativo, afinal você é vigiado 24 horas por câmeras, microfones invisíveis e funcionários espiões contratados especificamente para vigiá-lo;

6-) Não há conversas “a toa”; há trocas de informações; uma informação paga outra informação ou não há negócio;

7-) Não seja você; seja quem sua empresa quer que você seja;

8-) Colegas de mesmo nível hierárquico são concorrentes; colegas de mesmo nível e mesmo departamento são inimigos;

9-) Sempre! Escute bem: SEMPRE ! Sempre se passe por alguém atarefado, afinal você está envolvido em um "business" com faturamento bilionário. O máximo de seu esforço é o mínimo que você pode fazer por algo tão grandioso. Vide texto: “dicas para se passar por alguém atarefado”

10-) Toda vez que abrir e-mails fora do contexto, tais como correntes religiosas, ou mesmo da Causos Corporativos (alias, em nossa opinião, o Jeferson de Sistemas deveria permitir e-mails da Causos, já que estamos sempre divertindo seu contexto), minimize um pouco a janela e posicione-se exatamente na frente da tela, mantendo-se atento (a) e em posição de ataque com o dedão esquerdo na tecla ALT e o médio no TAB (lógico que você estará com alguma planilha aberta). Lembre-se que plano de fundo escuro no ambiente corporativo é estratégico, aliás, é um espelho.
11-) Almoços são estratégicos; jamais almoce casualmente. Todos estão observando seu círculo de contatos. Almoçar com alguém não popular, com um gerente mala ou com estagiários pode ser fatal. Há grande riscos de ninguém nunca mais almoçar com você.
11.1) Por mais que você seja solitário, jamais almoce sozinho; se o fizer, fará para sempre;
11.2) Por mais que o bife a cavalo do Bar do Antônio do lado da sua glamourosa empresa seja fenomenal, jamais entre neste. Seu filme vai incendiar se te flagrarem sentado num boteco.
11.3) Lembre-se: evite assuntos que não sejaM corporativos; você não tem tempo para BBB, futebol e afins. No mínimo, o assunto deve ser a bolsa de valores.
12) Jamais ria de piadas de estagiários, mesmo que o fulano seja cover do Ary Toledo. Após a piada, utilize-se de toda arrogância, virando para os seus afazeres em sua baia, sem qualquer feição de risos;
12.1) As piadas dos diretores são sempre engraçadas, mesmo quando não são (o que não é raro). Ria do começo ao fim, sem parar. No final solte aquele falsa gargalhada que só você sabe fazer.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

E-mails corporativos: Manual de "boas maneiras"

1-) Qualquer atividade ou troca profissional realizada deve vir inevitavelmente acompanhada de um e-mail; não importa o quanto você faz, o importante é o quanto os outros pensam que você faz

2-) Tome muito cuidado com as cópias ocultas;

2.1 Sempre coloque alguém em cópia oculta

3-) Jamais escreva algo comprometedor e pessoal; seja formal, afinal, dane-se o que você sente, aliás caso esteja abaixo do alto escalão, dane-se você;

4-) Independente de seu nível hierárquico, caso seja da filial brasileira de uma multinacional, jamais, sob hipótese alguma, redija alguma solução de ordem estratégica. Não importa o que achas, o que pensas e ninguém está disposto a apoiar sua idéia. Ofereça sempre soluções operacionais, práticas e baseadas em fatos reais. Você é remunerado para pensar sobre como otimizar os processos, criando formas automáticas de transpor números de um sistema a outro, além de criar relatórios eficientes. Aliás, isto é um tanto quanto cruel; uma espécie de suicídio de longo prazo: você desenvolvendo formas para o seu chefinho não precisar mais de você um dia.


5-) Finalização do e-mail;
5.1 O primeiro contato deve ser acompanhado do atenciosamente, afinal, você deve fingir ser sempre atento aos problemas do seu correspondente;
5.2 No segundo contato, abrevie; utilize “att.”; afinal você já está corporativamente mais íntimo do correspondente
5.3 Sds, para a terceira vez;
5.4 No quarto, vocês já são parceiros, mande logo um abraço e se for menina, mande um beijo;
5.5 No quinto, é ritmo de festa, abraços e beijos abreviados; Caso a correspondente seja uma donzela, abrevie o nome dela; e se for deveras atrevido, chame-a de princesa
5.6 Se o correspondente for de alto escalão, seja sempre formal, mesmo que ele(a) dê abertura para informalidades. Não caia neste truque: ele te dá corda . .depois puxa te enforcando; ele te leva aos céus, depois te joga de lá sem asas e para-quedas
5.7 “Sem mais para o momento” é jargão de secretária dos anos 80; jamais utilize!

6-) Seu erro foi apontado em e-mail com cópia para mais de cinco pessoas:
6.1 Jamais peça desculpa; humildade em empresas é fraqueza e assumir erros é derrota
6.2 Negue o erro enquanto puder;
6.3 Justifique o erro enquanto puder;
6.4 Minimize o erro enquanto puder
6.5 Culpe a área de sistemas;
6.6 Inverta o jogo, ache alguma falha partindo daquele que te acusa
6.7 Culpe estagiários de seu departamento;
6.8 Use sempre sujeito oculto; ao invés de utilizar, “eu poderia ter feito”, redija: “neste caso, uma boa alternativa seria”
6.9 Esconda-se atrás da própria falha, com frases de efeito do tipo: “neste momento, o importante é não achar culpados, mas sim soluções”
6.10 Em empresas, vale o ditado “com ferro fere, com ferro será ferido”; prejudique o camarada acusador de forma impiedosa na primeira oportunidade.


7-) E-mails direcionados a:
7.1 superior direto: devem vir acompanhados da mensagem “já está resolvido”; Mesmo que não esteja;
7.2 Colegas de mesmo nível hierárquico e departamentos diferentes: devem vir sempre acompanhado do “acho que ainda vocês não entenderam”. Colegas de outros departamentos são inimigos e seus e-mails devem ser rebatidos com cópia para seu chefinho. Além do mais, lembre-se que em empresas você deve ser prepotente e o clima é de guerra: no curto prazo, quem é mais cafajeste sempre chora menos;
7.3 Colegas de mesmo nível hierárquico e mesmo departamento: se mostre líder, mostre quem é o futuro chefe deles, seja imperativo em seus e-mails, porém de forma sutil. Exemplo: “Neste caso, o melhor a ser feito é x, y ou z”
7.4 Diretores, vice-presidentes e presidentes; evite trocar qualquer e-mail com estes senhores; Tudo que redigires será utilizado contra você no tribunal


8-) E-Mails em inglês:
8.1 Best Regards é próprio para aluno do cursinho de inglês de São Miguel; pareça internacional! Mostre-se globalizado! Utilize kindly regards!
8.2 Implore a atenção do seu colega corporativo da matriz de forma elegante. Utilize: Looking forward to hear from you soon;
8.3 Início do e-mail: Utilizar Dear James Thompson, no primeiro e segundo contato é plausível; após o terceiro é inexperiência; Mande logo um Hey James, ...
8.4 Could you please! Sempre! Mesmo que pareça do cursinho. Você é mal-educado, mas deve se mostrar polido
8.5 Lembre-se: em contatos com matriz, você é o peão, você reporta; então nunca esqueça: please, find attached; please, find bellow


9-) Polemize sutilmente para terceiros se digladiarem; depois concilie; a imagem vale mais que seu caráter . . .mostre-se um solucionador de conflitos, mesmo que tenha de ser o causador dos próprios;

10-) TODOS e-mails devem vir acompanhados da palavra URGENTE;

11-) Por vezes:
Seja bem humorado: chame seus colegas de departamento de prezados
Seja irônico: chame-os de senhores;
Seja irônico bem-humorado: chame-os de senhores do conselho (imaginem o Teixeira no conselho de administração. .é no mínimo engraçado)
Seja provocador: chame-os de colegas;
Seja provocador irônico: chame-os de amigos;
Seja tudo isso junto e de forma agressiva: chame-os de doutores

12-) Seu e-mail é seu documento; seu e-mail é sua sentença; seu e-mail te condena e te salva, seu e-mail te protege e te derruba; seu e-mail te salva, te mata e te ressuscita; utilize-se muito bem dos jogos de palavras e sempre saiba a hora certa de enviá-lo
12.1 E-mails corporativos jamais devem ser escritos em momentos de raiva. Pode ser fatal;

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Bolaños e sua prancheta

Para ser sincero, nunca soube ao certo qual o verdadeiro nome daquele mexicano com bochechas de Kiko, barriga de Nhonho, óculos de Seu Barriga e um ar de Firmino. Sua função tampouco era clara: não estava em nenhuma hierarquia das quais tínhamos acesso. Mas ele tinha cara de Bolaños e era assim que decidi apelidá-lo (para mim mesmo, obviamente).

Concentrado em minhas funções extremamente estratégias e vitais para a empresa: colocar Notas no Sistema, cotar o preço de Palm-tops e criar planilhas de vendas (o mais incrível é que eu era da área de marketing), demorei a perceber a sua presença silenciosa e calculista.

Bolaños chegou à empresa exatos 12 meses após o anúncio da fusão com a empresa mexicana e pouco menos de 2 meses após o maior fracasso de marketing da empresa em solo Brasileiro. Na ocasião, investiu-se caminhões de dinheiro para um aumento pífio de 2% nas vendas. Uma coisa estava clara: algo fedia...

Minhas funções me deixavam com bastante tempo ocioso e, entre um café e um cigarro, comecei a notar mais o que Bolaños fazia. Acompanhado de sua inseparável prancheta, Bolaños passou alguns dias simplesmente caminhando entre as baias e fazendo anotações. Começaram então a perceber sua presença.

O gerente da fantástica marca que obteve um incrível aumento de 2% em suas vendas era quem mais caçoava de Bolaños. Já temendo pelo pior, aquela era talvez a forma de se mostrar despreocupado e confortável com a situação.

Bolaños não falava com ninguém. Aliás, com quase ninguém. Os mexicanos trouxeram uma equipe grande de gestão. Era só com esses chicos que Bolaños falava, sempre com sua prancheta.

Na semana seguinte da sua chegada, saíra o anúncio do dissídio. Obviamente, o aumento de 3% negociado, causou mal-estar. Convocou-se então uma reunião do RH com os “colaboradores” da empresa.

Ninguém notou aquela figura pouco imponente no fundo da sala, acompanhado de sua prancheta. Fabrício Souza, gerente pleno de finanças, tomou a liderança da situação (com o objetivo indireto de ganhar a nota máxima no quesito Leadership & Coaching na avaliação de desempenho) e já foi logo dizendo que os funcionários estavam chocados com aquele aumento bem abaixo do esperado. Zé Carlos, Gerente Nacional de Vendas há 35 anos, famoso por abusar sexual e moralmente de suas funcionárias, concordou de bate pronto. Utilizando de técnicas de vendas da metade do século, chamou a atenção para si. E quem ousaria a interromper o dinossauro da Companhia (e perder as festinhas prives que dava em sua casa com a justificativa de “Jantares para clientes” em sua descrição de despesas do mês)? O time inteiro de vendas da fracassada marca fantástica entoou um grito de guerra. A bagunça se instaurou.

Foi aí que Bolaños, do fundo da sala, se apresentou:

- Buenas tardes, señores. Mi nombre es Arturo Domínguez. Soy gerente de recursos humanos para las Américas. Estoy en Brasil para entender mejor cómo la vida cotidiana de ustedes en La Compañía.

Subitamente, a equipe de vendas parou de gritar, o gerente de finanças foi ao banheiro e Zé Carlos, o safadão, se sentou.

Tarde demais. A prancheta de Bolaños já ditara o veredito final: demissão para o gerente de finanças que maquiou os números (o aumento de real de vendas da marca fantástica foi de 1,7%, não de 2%), demissão para Zé Carlos, o safadão, que só em “jantares” havia gasto R$ 50 mil no último ano, demissão para o Gerente de Marketing da marca fantástica e de toda a equipe de vendas da mesma.

Deu-se a fusão enfim. E Foi dado o recado: agora, quem manda são os mexicanos.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Corporatês - 2ª aula

Nesta segunda aula de corporatês, trataremos exclusivamente da classe dialética relacionada a mania de business english da ralé e semi-ralé corporativa. Estou longe do mundinho já faz um ano ( e quem está dentro se vangloria disto – vos digo: tenha certeza, uma jogadora de Tarot e búzios é mais feliz que você) e por vezes me atualizo com colegas que estão encarcerados nas baias. Um deles me contou que o analista Junior já não está mais em uma ligação; Agora ele está “IN CALL”.
A utilização do termo em Terras Brasilis é lamentável por si só, não restando muito a divagar. No entanto, pensando em sua origem, há uma hipótese. O nosso co-supervisor fora para o curso de International Accountancy Standards (entenda como turismo corporativo) nos EUA e durante o treinamento ficou os dias junto com o pessoal de lá. Então, quando retornou ao Brasil, falava o termo, mesmo quando não precisava. Por meio de infinitas redes de contatos, o termo se popularizou e hoje os favelados corporativos estão todos in call . .eles comem mortadela e arrotam um “estou in call”.
Se você deseja se manter em sua querida corporação pelo menos durante o período de experiência, jamais, nunca mais, diga rede de contatos. Você tem um NETWORK. Alias você não tem amigos, você tem network; da mesma forma, não faz amizade, faz network. Um corporativo que se preze não tem amigo! Tem contatos espalhados por todos os cantos. Embora existam coisas como o LinkedIn, tenham certeza que esta mania superficial e falsa de network tem um campo ainda maior para atuar. Em dentro de dez anos, haverá mercado de compra e venda de contatos. Net market: Luciana Hauber, atuação como analista de recrutamento, “morou” na Inglaterra seis meses – valor R$ 70,00; ainda acho que já tem coisas melhores em outros mercados por cinquentinha!
NETWORK é a evolução do antigo “círculo de amizade”. No auge dos anos 70 e 80, os meios de comunicação não eram tão evoluídos e o mercado não tão competitivo e grande, restringindo as pessoas à grupos menores. As panelinhas ou círculos de amizade eram grupos de pessoas que se mantinham em rede de “ajudas superficiais” (nada de emprestar dinheiro. . .mas sim indicações para emprego, clientes ou coisas do tipo) mútua.
Com o desenvolvimento econômico brasileiro em meados da década de 90, o mercado tornou-se muito abrangente e os corporativos daquela geração perceberam que o formato de grupos pequenos não estaria mais adequado, dado a gama enorme de opções e oportunidades. Então com a explosão da internet no fim da década, surgiu-se a idéia de ligar ou LINKAR todos os corporativos em redes de contato mundial – a aldeia da corporação global.
Entretanto, estava implícito que o novo conceito não funcionaria muito bem. Seria superestimar deveras o coletivismo e altruísmo do corporativo padrão. Ele é mesquinho, orgulhoso e egoísta bastante para não aceitar, de forma alguma, ser contato de qualquer um. Pensariam vocês que Régis – um compliance analist da Alpha - aceitaria ter qualquer vínculo, ligação ou contato (por mais virtual que seja) com a Francislene, a assistente administrativa da Augenor Contabilidade ? Seria muita ingenuidade de vossas partes.
Hoje, os poucos maliciosos círculos de amizade dos anos 70 e 80 vieram a transformar-se no preconceituoso, hierarquizado e internacionalizado NETWORK - grupos de pessoas com o currículo semelhante são contatos das outras e barreira de entrada é enorme, caso seu CV seja inferior. É a moderna sociedade de mercado dividida arcaicamente em castas.
Interessante é Fernando do Planejamento estratégico, que enquanto resolve algumas “buxas”, deixa as outras em STAND BY. A utilização do termo é um pouco justificável na medida em que passa 15 horas de seu dia na frente de um computador, mesmo assim, fico em dúvidas sobre o porque de não deixar o assunto “no aguardo”, ao invés de em stand by? As vezes fico francamente sensibilizado com a síndrome de cidadão do mundo dos corporativos; parece que há uma forte necessidade em parecer e aparecer internacional.
Uma vez na segunda aula, é hora de abordarmos as abreviações do business english. Desta vez, o escolhido é o FYI. Esta abreviação é uma forma polida que os corporativos adotaram para falar “não vai dizer que eu não avisei”. O PSI (Para Sua Informação) já seria suficiente, mas não basta ao corporativo ser corneteiro, ele deve espalhar o e-mail alheio em alto estilo; então solta o rebuscado FYI.
Mais engraçado é o B.R.!!! Não bastando a falta de coerência em nome de uma sofisticação no mínimo cafona e esdrúxula, na qual o fulano escreve um e-mail em português e o finaliza com um “Best Regards”, agora ele abrevia!
Lembrando os termos do início da década, não poderíamos esquecer do “IN OFF”. O termo popularizou-se tanto que hoje pode ser ouvido em qualquer conversa banal fora do contexto corporativo. O IN OFF eternizou-se pois reflete como nunca o espírito corporativo da restrição de assunto dividida por castas. Quanto mais IN OFF te contam, mais influente és na organização. Verdadeiramente, o termo é a sofisticação corporativa do famoso pedido da suburbana fofoqueira: “pelamor de Deus, você não conta nada pra ninguém hein!”.
Os “IN OFF” geralmente são contados em almoços, cafés ou happy-hour, porém jamais em território corporativo não neutro (o café é considerado neutro), pois conforme sugere o quinto mandamento das paranóias corporativas (vide próximos textos), a empresa é cercada em toda sua dependência por câmeras, microfones e “colegas espiões” contratados especificamente para te vigiar.
Estes dias estava saindo de casa e cruzei com a Dona Maria, uma vizinha de rua. Ela me deu bom dia e logo adiante não resistiu: “ menino, você não vai acreditar . . olha, eu vou te contar mas é enhofi. ..” então pensei: se o “enhofi” chegou nos bairros, por que, também, não separar as baias com portões? São mais adequados para fofoca.
Realmente muito engraçado é ver o Aranha – gerente do fiscal – sendo chamado de COACH pela Isabel da área de treinamento. Quando ouço o jargão corporativo bastante invocado pelos RH´s, me vem a mente aqueles treinadores de futebol americano com aquele bonezinho, um apito pendurado e aquele uniforme de esportista.
Mal posso imaginar oAranha chegando vestido nesses trajes e apitando no departamento inteiro, pedindo nota fiscal para o Dorival, o assistente sênior do fiscal, aquele senhor de 60 anos que conhece todas as notas da Alpha desde 1970. Isto acontece e chega a ser surreal chamar Aranha de coach do Dorival. Surreal mesmo é o abuso do inglês no corporatês que procura enquadrar e padronizar todos segundo seus jargões e expressões.
As grandes empresas não são formadas por marcianos, mas por pessoas provenientes de um mesmo povo e, portanto, embora os RH´s procuram cultivar e estabelecer uma cultura de aldeia global com sofisticação, diferenciação e internacionalização, as corporações refletem os mesmos vícios sociais de seu país. Afinal, o que somos nós brasileiros? Em minha opinião, seguidores alienados e obcecados em transformar aquilo que vem de fora em nosso. Cazuza é mesmo imortal em dizer que brasileiros burgueses são caboclos querendo ser ingleses.